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quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Dom Casmurro 26



A podridão da sociedade refletirá em todas as suas vertentes. Já ouviu isso alguma vez? Leu a respeito? Essa idéia traça a noção do grande círculo dependente criado por nós, hoje em queda gradativa de valores, a nossa sociedade como um todo. Começaria, nesta ordem, sempre no berço familiar o estopim da desgraça, passando seus desastres por herança maldita, doados por fim a outras famílias inocentes. Há, então, uma margem, um beco, um muro, separando os seres de bem e necessários dos expurgos danosos à pátria? Não.

Hoje podemos vagar sobre a continuação da sociedade dentro de nossas casas através da internet e, com isso, podemos observar claramente o câncer voluntário desenvolvido nas pessoas. Se lá fora o povo se bate, trocam ofensas, se nas ruas há vasto império de ignorância e violência, na internet não poderia ser diferente, sendo essa uma vida continuada virtualmente da nossa sociedade atual. Dom Casmurro 26, este é o código desencadeador da história real que lhes proponho. Não pouparei os palavrões, já que pretendo mostrar um pedacinho de nossa realidade atual, sem floreios; e que fique marcado como parâmetro de estudo este meu experimento.

Numa madrugada de terça-feira, sem muito o que pensar, ou com medo de pensar demasiado, resolvi entrar em uma dessas salas de bate-papo, como costumava fazer na adolescência. Procurei uma sala específica, com idade limitada entre vinte e trinta anos. Um apelido... Teria de escolher um apelido. De momento, não consegui pensar em nada, que diabo de apelido... Eis que, literariamente abduzido, coloco-me entre os outros sob a estranha alcunha de Dom Casmurro 26 (vinte e seis é a idade). Fiquei, primeiramente, em postura de observador, tanto dos outros apelidos quanto do comportamento geral das pessoas. Estavam lá o ‘Tenente bem-dotado’, o ‘Tijucano20cm', ‘a Advogata molhadinha’, ‘Carente web cam’, a ‘Carinhosa Barra’, o ‘Negão JPA 22cm’... Tinha mais gente, alguns bem discretos, mas a maioria dos apelidos seguia essa linha de excitação e régua. O tamanho do pênis era exaltado como o maior troféu de um homem; isca eficaz e autos-suficiente para uma boa pescaria.

Passado certo tempo, um desses caras de 20 cm me manda a seguinte mensagem: -Aê otário, que porra de apelido é esse? Não respondi nada ao cedro real, não vi motivos para resposta. Logo ele mandaria outra mensagem. – Tu deve ser o maior canhão né... Otário. Perguntei a ele se essa incrível dedução de minha feiura foi por eu gostar de ler livros. – Vai tomar no cú rapá! Manezão do caralho. O cara, a coisa, o troço, realmente queria confusão, então eu não iria responder mais nada. Mesmo assim continuava xingando sem parar, e logo os outros começaram a seguir seu precioso exemplo; mas por que os outros também? Eu não respondi a nenhum palavrão, nem ao menos respondi depois das ofensas sofridas! Incrível! Uma cascata de ofensas, chacotas absurdas! – Tú nunca comeu ninguém filho da puta, sai daqui porra! KKKKKKKKKK. Que loucura! O Dom Casmurro, e seu “diferencial”, gerou ódio em 80% dos presentes, e tratamos aqui de quarenta e duas pessoas, em variadas reações contra o estranho no ninho. O negão JPA repetia que se fosse pessoalmente já teria me descido a porrada. – Ainda botava no rabo da Capitu - disse ele.

Confesso que aquilo mexeu comigo, não havia dito nada, meu crime foi trazer a “infeliz” lembrança de Machado de Assis, coisa que nem sei o motivo (quando adolescente entrava como BestBoy, Johny, pancadoRJ, Cariocão18, nunca tive problemas), no entanto agora eu entendia perfeitamente a luz que me foi enviada. A manada segue um líder no reino animal; a busca pela integração -ser igual- faz com que algumas pessoas cresçam sem a compreensão de irmandade e justiça, pois se vale tudo para ser igual, se esse é o único caminho para a felicidade plena. Essa sala de bate-papo virtual conseguiu servir de perfeito exemplo para muitos caminhos que tentarei demonstrar rapidamente. Bullying, agressões repetidas de um valentão e seu grupinho contra um indivíduo considerado diferente, ou indefeso. Bullying, como os Alfa Beta exerciam sobre os LAMBDA LAMBDA LAMBDA (Do filme: "Os Nerds"), como um professor que faz vista grossa enquanto os alunos discriminam um deficiente. Isso que o pobre "Dom Casmurro26" estava enfrentando na verdade chama-se Bullying virtual, a continuidade do Bullying por meio da internet, ocorre de várias maneiras, como por exemplo, quando um grupo resolve perseguir um indivíduo em sites de relacionamento, blogs, pegar suas fotos para fazer montagens constrangedoras, perfis falsos (Fazem uma página de internet como sendo sua). Comecei a pesquisar sobre o assunto, paralelamente fui visitando várias salas de bate-papo com o "Dom Casmurro 26", em algumas encontrei pessoas bacanas, poucas, bem poucas. A maioria seguia o mesmo padrão da primeira vez: expurgar o diferente. Quantas palavras horríveis... Quantas pessoas... Sempre começava por um, o puxador de coro; então, já cansado das pedras pontiagudas, eu saia; e logo depois entrava em outra sala, onde receberia mais pedradas insanas. Pobre Machado, pobre Dom Casmurro... Tão respeitáveis, tão dignos, tão nobres, não poderiam em 2010 frequentar as salas de bate-papo da internet. E, se vivos, apanhariam do Negão JPA 22 cm, do Pleyba_ 21cm.

Fica impossível não chegar às grandes preocupações quando imaginamos o que algumas crianças, adolescentes, não devem sofrer diariamente em seu convívio. Quantas mentes são tosadas de voo livre pela referência traumática de uma normalidade imposta sob fogo. O que estamos fazendo?! O que Diabos estamos fazendo às pessoas?! Somos todos iguais, perecíveis! É triste, é insólito, é indigesto, cruel. É difícil acreditar que ainda somos os mesmos bandeirantes dos presídios portugueses a converter e massacrar os índios; é trágico olhar as palavras de Deus mortas em mil vasos sanitários ricos e pobres; é uma bosta pensar que somos todos irmãos... Dom Casmurro 26, Advogata molhadinha, Negão JPA 22 cm, juntos no limbo à espera de julgamento e destino. Juntos na Terra, planeta sofrido que tanto depende de nós. Pois é. A esperança no ser humano deste século não é só uma virtude, meus amigos; é uma dádiva. E sinto de cá uma grande dificuldade em crer que os governantes e decisivos compartilhem de certas sensibilidades humanas. Quem me garante que um deputado não tenha xingado Dom Casmurro26? Um vereador talvez... Quem me garante que as pessoas que decidem erros não mataram os sonhos de muitos no caminho - assassinos; como posso confiar, se não vejo as entranhas de suas mentes, se não leio seus desejos mais profundos nesta vida?

Acreditar no bem é mesmo uma dádiva. Ainda mais se refletirmos sobre cada cabeça; e se soubéssemos os segredos e costumes sobre cada família.

6 comentários:

  1. Oii! Gostei do seu blog, e já o estou seguindo.
    Prazer, sou Srtª Bêêh, estarei aqui a cada postagem.
    beijoos;*

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  2. Que análise interessante.
    A realidade que as pessoas vivem hoje dneota o quanto elas não conseguem de fato sustentar seus próprios desejos. É como se o outro estivesse a cada mais coisificado enquanto tal.

    Gostei das argumentações, irei segui-lo.
    abraços
    www.cinefreud.blogspot.com

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  3. "Quantas mentes são tosadas de voo livre pela referencia traumática de uma normalidade imposta sob fogo."

    Exatos retratos psicológicos. Descreve diversos problemas nucleares, apelando para uma consciência social em relação ao comportamento humano. E o modo como os descreve ativa em cheio as balanças interiores. Tomara que elas pendam para o lado do bem. Achei incrível.

    Parabéns!

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  4. Parabéns pela proposta do seu espaço, caro Pitz

    Reflexão, atual e bem expressivo.

    Gostei do tom verde de fundo, do layout e do cuidado com as palavras, fiquei bem satisfeito.

    Te sigo, viu? e te linkarei ao meu blog!

    abraço

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  5. Olá, antes de mais nada, parabéns pelo blog!
    E por acha-lo de muito bom gosto é que o/a convido a vir conhecer meu projeto.

    Aguado tua visita!

    Forte abraço!

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  6. Bom dia!
    Gostei muito daqui. Sao blogs destes que me fazem correr a blogosfera.
    Fiz registo e pretendo voltar.

    Abracos
    Francisco

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Este blog surgiu após inúmeras recomendações, broncas, cascudos e beliscões de conhecidos. Aqui está, enfim, um espaço próprio para o escritor Allan Pitz publicar suas "Patavinices", seus textos, seus livros, e tudo o mais que o tempo for lhe guiando e desenvolvendo.

Obrigado pelo incentivo de todos.