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segunda-feira, 13 de setembro de 2010

O MICO



Lá estava eu sentado confortavelmente em uma poltrona, na varanda de um arborizado e aconchegante sítio em Teresópolis... Tomava meu café forte lendo o jornal, quando subitamente aparece um macaquinho cinza, bem miúdo, saracoteando ligeiro entre as pilastras de madeira. Parecia buscar comida... Parei de ler e fiquei olhando aquele macaquinho... Os movimentos rápidos, a expressão sacana, um ar sorridente meio malandro, a inquietude natural. E por que não sentiu medo de mim? Um macacão barbudo com uma caneca enfumaçada na mão, óculos de leitura na cara. Fiquei olhando... Em dado momento ele deu um pulo, parando sobre a mesinha onde eu havia espalhado partes do jornal. Encarou-me sério e parou de sorrir.

- Por que tá me olhando com essa cara de bunda? Tem alguma coisa aí pra eu comer?

O macaco falou? Ao invés de correr, brinquei com a irrealidade singular do momento.

– Tem umas bananas lá dentro... Você fala?!
- Não... Sou letra de Braille, mané. Não tá me ouvindo falar não? É isso mesmo que te parece. Tô com raiva porque cortaram a bananeira. Jurei que falaria com o primeiro cretino que me olhasse como se eu fosse um ET. Vocês tinham é que pedir a benção da macacada! Somos pais dos seus ancestrais mais antigos!... Tem cigarro aí?

Dei um cigarro aceso ao macaquinho, mas sugeri que ele tomasse cuidado com os males do tabagismo. Ele, é claro, mandou-me para lugares nada cristãos.

- Sou pequeno, mas nunca fugi de nada não, cara, encaro qualquer uma na boa. Este cigarro aqui está fraco... Tinha que ver os que o Pajé me dava na aldeia, aqueles sim! Teve um dia que acordei abraçado com uma onça pintada. Pela cara de satisfação da bichana a noite deve ter sido bem animada!
- Não consigo acreditar! Estou conversando com um macaco!!
- E eu com um idiota! É a vida! Aceite e seja feliz. E se eu te dissesse que tudo o que existe no mundo humano é baseado em mentiras, ilusões, até os dogmas eternos?
- Eu falaria que você não é só um macaco falante, é muito estranho, e está me assustando também. Parece outra coisa usando o corpo simplório de um macaquinho.
- Eu digo que está certíssimo, escritor. Mais certo do que algumas porcarias que você escreve.

Um enorme gavião, em voo espetacular, invadiu a varanda levando consigo o misterioso macaco nas garras em fração de segundos, sem que o esquisito terminasse ao menos seu cigarrinho fraco.

Para não enlouquecer, culpei o fabricante do café, por introduzir substâncias alucinógenas em sua composição. O processo ainda corre na justiça. Melhor isso do que tentar creditar ao macaco choroso por sua bananeira o rótulo de demônio... Ou acreditar que o gavião esfomeado era algum Deus hipotético, em defesa de minha alma.

Culpei o fabricante do café, sim. E me senti novamente o maior dos humanos!

2 comentários:

  1. Obrigado, Nanie!

    Momento reflexão bem simples sobre os limites da compreensão humana.

    Eu e o macaquinho falante... Hehe.

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Este blog surgiu após inúmeras recomendações, broncas, cascudos e beliscões de conhecidos. Aqui está, enfim, um espaço próprio para o escritor Allan Pitz publicar suas "Patavinices", seus textos, seus livros, e tudo o mais que o tempo for lhe guiando e desenvolvendo.

Obrigado pelo incentivo de todos.